Elaboração de um modelo para formação planetária dentro do código magneto hidrodinâmico FARGO3D

Autor Luiz Alberto de Paula
Orientador Tatiana Alexandrovna Michtchenko
Tipo de programa Doutorado
Ano da defesa 2018
Palavras chave Formação planetária; migração planetária e simulações hidrodinâmicas
Departamento Astronomia
Resumo

De acordo com o modelo sequencial de acreção, os planetas gigantes se formam através de um núcleo sólido a partir da captura de planetesimais. Esse núcleo, atingindo uma determinada massa, é capaz de capturar o gás residual do disco protoplanetário que constituirá o seu envelope, formando, então, um planeta gigante (Mizuno, 1980; Pollack et al., 1996). A parte crı́tica desse cenário está no ajuste dos tempos de formação do núcleo sólido, de captura do gás e dos processos de migração planetária com o tempo de vida do disco (Mordasini et al., 2010). Resultados numéricos mostram que o tempo necessário para a formação de um planeta gigante é muito alto em relação ao tempo de vida do disco, e, que a migração planetária pode ser muito rápida, levando os planetas a caı́rem na estrela antes de sua completa formação.
Em geral, os trabalhos sobre formação planetária tratam a migração do planeta utilizando prescrições analíticas (Fortier et al., 2013). No entanto, diversos efeitos associados à termodinâmica do disco de gás fazem com que esses modelos analíticos sejam limitados para lidar com a migração planetária (Paardekooper et al., 2010).
De fato, para lidar com a migração planetária de tipo I, esses resultados analíticos se utilizam de discos de gás fisicamente simples e da linearização das equações da hidrodinâmica (Meyer-Vernet e Sicardy, 1987; Tanaka et al., 2002). Para a migração de tipo II, a situação é ainda mais complicada, já que a alta massa do planeta cria um gap em torno da órbita planetária, que impõe uma quebra da linearidade, impossibilitando a obtenção de uma prescrição analı́tica (Bryden e Lin, 1999).
Assim, os resultados numéricos obtidos a partir de simuladores hidrodinâmicos, como o FARGO3D (Masset, 2000; Benı́tez-Llambay e Masset, 2016), ZEUS (Stone e Norman, 1992), PLUTO (Mignone et al., 2012), entre outros, são essenciais para uma análise mais robusta dos processos de migração planetária dentro de uma gama maior de condições fı́sicas para o disco de gás.
No entanto, os simuladores hidrodinâmicos que tratam da interação do planeta com o disco de gás, em geral, não possuem um modelo para formação planetária. Em alguns deles, modelos para acreção de gás são construı́dos com base no regime de runaway dessa acreção (Kley, 1999). Todavia, a acreção de sólidos e a acreção de gás para planetas de baixa massa, na maior parte dos casos, não são levadas em consideração. Boa parte disso se deve ao fato de os modelos de formação planetária usarem simulações N-corpos, que, aliados ao código hidrodinâmico, seriam altamente custosos computacionalmente. Assim, torna-se necessário o uso de modelos alternativos para a formação planetária, que sejam capazes de reproduzir os resultados de uma simulação N-corpos de forma confiável.
Construir um modelo que considera a acreção de sólidos e gás é uma tarefa árdua e ao mesmo tempo desafiadora. Assim, o presente projeto propõe a implementação de um cenário fisicamente plausível para a formação planetária dentro do código magneto hidrodinâmico FARGO3D.
Para modelar a acreção de planetesimais, usamos como base os trabalhos de Guilera et al. (2010) e Fortier et al. (2013), que utilizam um modelo estatı́stico para determinar a taxa de acreção de planetesimais (Inaba et al., 2001). Esse modelo será implementado pela primeira vez no FARGO3D. Atualmente, sabe-se que a acreção de peebles (material sólido entre cm e mm) tem um impacto importante na formação planetária (Lambrechts e Johansen, 2014; Guilera, 2016; Johansen e Lambrechts, 2017). No entanto, núcleos de poucas massas terrestres possuem um envelope planetário que poderia destruir esses pebbles antes dele alcançar o núcleo (Venturini et al., 2015). Nesta tese, iremos nos preocupar apenas com a acreção de planetesimais, deixando o estudo do pebbles para trabalhos futuros.
Para a acreção de gás, iremos modificar o modelo de Kley (1999) incorporado no FARGO antecessor. Essas modificações visam incorporar o raio de Bondi (Bondi, 1952) para determinar a zona de acreção, o efeito da altura do disco e a mudança na taxa de acreção de gás de acordo com a massa do planeta. As modificações implementadas no modelo de acreção de gás foram realizadas com base nos trabalhos de Dürmann e Kley (2015), Russell (2011) e Fortier et al. (2013). A adaptação no código de acreção de gás para levar em conta uma faixa maior de massas planetárias foi realizada utilizando a escala de tempo de Kelvin-Helmoltz. Para isso, seguimos o trabalho de Ikoma et al. (2000) e Idae Lin (2004b).
Para testar o modelo de formação planetária no FARGO3D, a simulação padrão para o disco de gás utilizada nesta tese adota um disco bidimensional fino com taxa de acreção constante. A razão de aspecto do disco será de h = 0.05 com um fator de curvatura de λ = 0.0. Esses valores são consistentes com a teoria de discos finos e são usados nas maioria das simulações que envolvem discos de acreção (Bell et al., 1997; Frank et al., 2002). O disco é assumido localmente isotérmico e a viscosidade do disco é dirigida pela prescrição α de Shakura e Sunyaev (1973), com α = 0.03. O modelo de disco é simplificado e caracterı́sticas importantes podem influenciar no processo de formação e migração planetária, como as trocas de energia. No entanto, ele é um ótimo modelo inicial para um teste consistente do modelo de formação planetária implementado, já que possui um resultado analı́tico conhecido. Casos mais complexos serão explorados em trabalhos futuros.
Com o modelo de formação planetária implementado, foi possível estudar simultânea- mente a formação e a migração do planeta dentro do simulador hidrodinâmico. Isto é, analisamos a escala de tempo envolvida no processo de migração em conjunto com a escala de tempo da formação planetária para vários parâmetros fı́sicos envolvidos no modelo. A análise revelou, para nosso modelo de disco, que a escala de crescimento do planeta conseguiu se manter mais baixa que a escala de migração, mesmo quando o planeta atravessou a linha de gelo, local onde há menor quantidade de material disponı́vel para a acreção de sólidos. Assim, para planetesimais pequenos (raio 0.1 km), foi possı́vel obter planetas com massas próximas de 5 massas de Júpiter em regiões entre 0.5 e 1 ua, num tempo menor que o tempo de vida do disco.
Vale ressaltar que esta tese conta com uma descrição detalhada de como implementar o modelo dentro do FARGO3D, incluindo um apêndice com o programa comentado linha a linha. O intuito é que o leitor possa usar esse modelo de formação e migração planetária para obter novos resultados e vı́nculos sobre a formação de sistemas exoplanetários ou do nosso Sistema Solar, assim como usar em qualquer outra aplicação que julgar necessária.

 

Anexo t_luiz_a_paula_corrigida.pdf